Durante o período de aceleração dos dez meios vencedores do Fundo Velocidad foi realizado o Capítulo de Gênero, Diversidade e Igualdade. Por meio de uma série de encontros virtuais e a criação de manuais, a formação buscou ter impacto em uma perspectiva relegada no jornalismo, no interior e exterior das redações.
“Inicialmente, consideramos que toda empresa, organização e, neste caso, um meio deve ter uma abordagem responsável e profissional das temáticas de gênero e diversidade, que proponha um enfoque interno como gestão de equipes, colaboradores, terceiros, e um enfoque público”, disse Vanina Berghella, Diretora da Velocidad. Para ela, nos meios, também deve ser considerado, particularmente, o aspecto editorial e de cobertura jornalística.
A experiência de aprendizagem
Sandra Chaher, jornalista especializada em temas de gênero e diversidade e Diretora da Comunicar para la Igualdad, foi responsável pela criação do processo de consultoria e de formação. Acerca da experiência ela disse: “Foi muito boa, em geral, estavam muito bem dispostos a incorporar novos temas”. Durante os encontros, a maioria dos meios disse que não contava com protocolos formais para trabalhar as questões de violência. “Eu acho que isso está evidenciando uma falta que deve ser preenchida, já que as situações de violência são habituais em qualquer estrutura de trabalho e, em geral, são invisibilizadas”, disse Chaher.
Foram realizados três encontros gerais nos quais se trabalhou com diferentes materiais realizados especialmente para esta ocasião: um “Guia de Princípios de Gênero, Diversidade e Igualdade”, um “Protocolo de atenção frente a situações de violência” e um “Guia de conteúdos com perspectiva de gênero”. Depois, cada meio aprofundou as aprendizagens com nove consultorias, cada uma delas localizada no país onde o meio se encontra.
“A necessidade de trabalhar com consultoras táticas locais responde a duas questões. Uma está relacionada com os aspectos legais sobre a violência de gênero em cada país. A outra se refere à necessidade de trabalhar ao redor de uma cultura em comum”, contou Mijal Iastrebener, co-fundadora e diretora geral da SembraMedia. “Os desafios que encontramos nos meios são similares na região, mas quisemos ser respeitosas de que cada país, e cada meio têm uma cultura e uma forma própria de tratar esta temática.”
Para organizar a experiência de formação na aceleradora, a equipe decidiu ler materiais produzidos pelo ecossistema, por organizações de direitos humanos e de ativação cívica. “Cruzamos este estudo preliminar com os tratados que conhecemos na região e que as Nações Unidas revisam a cada ano no Comitê de Status da Mulher”, explicou Iastrebner. Depois, foram identificadas as potenciais dificuldades nos meios nativos digitais independentes. “Inspirados pelas certificações que as Nações Unidas outorgam a empresas nos processos para obtê-las, propusemos um plano que foi compartilhado com as especialistas da Associação Comunicar para la Igualdad”, acrescentou.
Para Berghella, a abordagem de forma transversal para os dez meios participantes foi muito importante. “Num programa deste tipo, onde são abordados os processos de aprendizagem de forma integral, poder incorporar um capítulo de gênero e diversidade que permita a reflexão, o ensino, a troca de experiências e a criação de processos, tem enorme valor para todos”, disse.
Por que falar sobre perspectiva de gênero em uma aceleradora?
Durante o processo de aceleração do Fundo Velocidad, os líderes se formaram em áreas tais como negócios, sustentabilidade e liderança para que seus meios crescessem e fossem sustentáveis. Por que foi adicionado o capítulo de gênero?
“Em termos simples, sem uma abordagem de diversidade, os meios de comunicação não podem cumprir plenamente o papel que lhes corresponde em sociedades pluralistas e democráticas”, disse Gabriela Hadid, que faz parte da equipe latino-americana da Luminate. “Isto é importante no mundo inteiro, mas é particularmente importante numa região como a América Latina, onde durante muito tempo os homens dirigiram os meios de comunicação”, acrescentou.
“Os meios têm uma longa história de serem dominados por homens nas posições de liderança”, disse Patrick Butler, Vice-presidente de ICFJ, sobre os desafios da região. A situação é diferente nos meios digitais: segundo o estúdio Punto de Inflexión da SembraMedia, quase 40% dos meios nativos digitais estudados nos quatro países contam com fundadoras mulheres. “Mas ainda que os meios digitais sejam muito melhores que os meios tradicionais na hora de garantir que as mulheres estejam representadas na liderança, há muito ainda que eles podem fazer. Quanto ao assédio sexual, a América Latina tem história de machismo nas salas de redação”, afirmou.
“A Velocidad é um espaço de crescimento, acompanhamento e comunidade dos meios independentes, mas nós pensamos também a aceleradora como um modelador do ecossistema”, disse Iastrebner.
A criação de protocolos de atuação frente a situações de assédio, a criação de um guia de tratamento jornalístico com igualdade de gênero ou o desenvolvimento de reuniões de equipe para tratar estes assuntos são alguns dos impactos que já começaram a acontecer nos meios que participaram da formação. “No início, cada meio tinha diferentes níveis de envolvimento com a temática de gênero e diversidade. Entretanto, o trabalho realizado com a Velocidad permitiu que todos pudessem aprofundar o trabalho prévio ou ampliar as linhas de ação”, disse Berghella.